domingo, 16 de maio de 2010
Do conhecimento das mulheres
" Acaba por nascer o dia em que se torna mais do que evidente que muito pouco são os que merecem o título de "homem". Quanto mais consciência disto temos, menos homens os que encontramos. Se nos agarrarmos tenazmente a tal ideia, acabaremos no vazio do Himalaia, para aí descobrirmos que aquilo a que se dá o nome do homem ainda está por nascer.
Neste processo de adaptação masculino à realidade, o mundo feminino parece sofrer uma deformação prismática. É nesse momento do curso do desenvolvimento de cada um, que aparece alguém que "conhece as mulheres". É o cretino realista, o indivíduo terra-a-terra, que julga que dormir com uma mulher é conhecê-la. Em virtude de inúmeras colisões com o sexo oposto, a sua maquilhagem viu-se acrescentada de algo que passa por conhecimento. Uma espécie de peruca psicológica, se assim podemos dizer. Confrontado com uma mulher real, com esta experiência real, este tipo de indivíduo não poderá deixar de fazer uma figura tão ridícula como a de um velho que tenta parecer jovem. A peruca torna-se o centro das atenções.
Lembro-me de um fulano, que foi meu companheiro de borga, durante este período transitório. Lembro-me das suas poses grotescas perante as mulheres, e de como isso me afectou. Ele estava sempre a exprimir a ideia de que apaixonar-se desesperadamente era o mesmo que correr para a desgraça. Nunca te dês todo a uma mulher! Por isso, fazia questão de me proteger. Mostrava-me como devia fazer para me comportar de um modo natural, como ele dizia, com as mulheres.
O estranho era que, durante as nossas aventuras, acontecia muitas vezes que as mulheres que o tipo tratava tão arrogantemente se apaixonavam por mim. Não levei muito tempo a descobrir que os objectos da sua escolha não se deixavam impressionar por aquela fanfarronice. Era mais do que óbvio, pela maneira como as "presas de caça" o protegiam maternalmente e lhe concediam a sua condescendência, que o facto de ele pensar que "sabia lidar com as mulheres" não passava de uma ilusão. Vi que aquele "homem vivido" era para elas uma simples criança, mesmo que na cama ele as fizesse gritar de prazer, ou gemer e soluçar, ou agarrarem-se a ele com um desespero silencioso. Ele tinha o costume de desaparecer de cena abruptamente, como um cobarde, uma fuga precipitada. "Uma cona é uma cona", dizia ele, tentando esconder o pânico, e depois coçava a cabeça e punha-se a pensar em voz alta se não haveria uma, ao menos uma, que fosse diferente.
Por muita importância que eu tenha vindo a dar à "cona", sempre me interessei mais pela pessoa a quem ela pertencia. Uma cona não tem existência separada e autónoma. Como tudo o resto. Tudo está ligado."
Henry Miller
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